“[O marketing] no futuro irá valorizar a capacidade de perguntar”
“Hoje, no marketing, falam-se as linguagens dos números e das palavras. A estas duas, o futuro acrescentará a linguagem visual, a musical e a arquitetónica. A importância que se dá hoje aos aspetos sensoriais é já um sinal do futuro.” – quem o diz é Sónia Marques, docente do Programa Avançado de Marketing.
Como será o marketing do futuro e que sinais, hoje, já estão a indicar esse futuro?
[SM] O marketing do futuro? O marketing do futuro passará por marketers poliglotas. Hoje, no marketing, falam-se as linguagens dos números e das palavras. A estas duas, o futuro acrescentará a linguagem visual, a musical e a arquitetónica. São já sinais do futuro, a importância que se dá, hoje, aos aspectos sensoriais. Também o modo como a linguagem verbal se mistura com a visual e a facial, nos “emoticons” das redes sociais, indica a transição até à diversidade de idiomas no marketing.
O futuro do marketing também passará por marketers desenvoltos a equacionar hipóteses. Tarefas do marketing como entender os fenómenos do consumo, fazer novos lançamentos e responder aos rivais, deixarão de resultar do pensamento sobre o que “algo é”. O marketing usará outra forma de pensar, mais criativa, e equacionará o que “algo pode ser”. Um sinal atual, desta mudança, é a importância dada ao “design thinking”. O passado sobrevalorizou o ato de responder. O presente demonstra-nos, já, que o futuro irá valorizar a capacidade de perguntar.
No futuro, o marketing deixará de ver o consumidor como um indivíduo, alguém singular, um decisor autónomo, para passar a ver os consumidores, no plural, como seres sociais, e o consumo como decidido, em grande medida, pela cultura. Ou seja, o futuro do marketing dará um maior ênfase ao contexto do consumidor. As pessoas compreendem o mundo através de pressupostos culturais e são, todos os dias, influenciadas pelas mensagens dos media e das redes sociais.
Enquanto o marketing atual coloca o consumidor no palco e esquece o pano de fundo, no futuro querer-se-á compreender o contexto, o pano de fundo, a cultura. Afinal, ninguém nasce consumidor.
Por exemplo, quando hoje, nas reuniões de trabalho, se menciona que algo “é cultural” surgem sorrisos e um efeito de acalmia. No futuro, a mesma menção ao “cultural” irá desencadear questões, iniciativas e itens no planeamento. Os gestores de marca quererão compreender as regras culturais, os rituais e as normas sociais que ditam “o que é esperado” e o que é “óbvio” para os consumidores. Por isso, no futuro, expressões como “saliência cultural”, “códigos emergentes” e “sincronização cultural” farão parte do léxico do marketing. Hoje, a etnografia, é o sinal da crescente importância da cultura nas ferramentas de marketing.
Que tipo de competências necessitam os marketers de desenvolver?
[SM] Competências? De facto, trata-se, sobretudo, de uma questão de atitude. Os marketers, tal como os profissionais de outras áreas, devem ver o futuro como algo a fazer, e não como algo que lhes irá acontecer. Se os marketers encararem o futuro como algo a concretizar, no presente, não só ganharão motivação, como aumentarão as suas possibilidades de sucesso. Para fazer o futuro no presente, terão de estabelecer planos, planear projetos e processos de aprendizagem. Terão de mudar a dimensão temporal, alargando-a um pouco.
Pensar, como hoje é habitual, em meses, trimestres e anos é necessário, claro, mas um presente que decida um futuro, implicará ciclos longos, de três, cinco e sete anos.
Por exemplo, uma das competências que um marketer deve ganhar é uma leitura histórica dos fenómenos. Não se deve, apenas, dar ênfase ao que muda. Também é rico compreender o que se mantém constante. Todos vivemos com ideias e crenças que se mantém inalteradas há séculos. Quando se ganha um ângulo sobre a história, consegue-se distinguir entre o conjuntural e o estrutural, ganham-se critérios para distinguir o acessório do essencial, entende-se que o que parece novo é, de facto, velho, e ganha-se uma distância, salutar, sobre tudo o que rodeia os consumidores.
Depois, os marketers terão de desenvolver competências interdisciplinares. Hoje, faz-se muito “intra-marketing”, mas o futuro requer competências “inter-marketing”.
Os currículos devem cruzar áreas distintas. As neurociências e a psicologia são já uma realidade. O campo da história já foi mencionado. Mais áreas? A antropologia é incontornável para o marketing, tal como o é a psicologia, a semiótica e o design. Sobretudo, será necessário ter sensibilidade para a complexidade e uma atitude aberta, curiosa, cooperante e colaborativa.