O marketing ajuda as empresas a venderem e a criarem valor. Para isso, disponibiliza um conjunto de ferramentas no domínio da análise, tomada de decisão e execução que apoia os gestores no estabelecimento de objetivos e rumos de ação de uma forma consistente no mercado.
Para além do foco na venda propriamente dita, o marketing também contribui para o desenvolvimento de relações duradouras e mutuamente vantajosas com os clientes e outros stakeholders. É neste contexto que se fala em marketing relacional como complementar do marketing transacional que é mais centrado nas vendas ou, se se preferir, nas transações. Em qualquer dos casos, um não vive sem o outro.
Curiosamente, tudo isto tem a ver com a solução governativa que vigora em Portugal desde 2015. A chamada geringonça - mais formal na primeira legislatura de António Costa e mais tácita desde 2019 - é um bom exemplo da aplicação de marketing relacional sem deixar de lado a vertente mais transacional.
PS, PCP e Bloco de Esquerda começaram por estabelecer um entendimento com o propósito de assegurar entre eles um relacionamento "duradouro e mutuamente vantajoso" - é o marketing relacional a funcionar.
Dentro dessa relação há a grande prova de fogo que se chama aprovação do Orçamento do Estado. Este pode ser visto como o "produto" que todos os anos o Governo tem necessariamente de "vender" aos seus parceiros de esquerda, sob pena da estratégia de marketing relacional se desmoronar. E para assegurar que o orçamento é aprovado há que negociar um "preço" que é pago em apoios sociais, mais regalias e, com frequência, menos deveres - como foi o caso da passagem de 40 para 35 horas de trabalho semanal na função pública.
Mas depois surge de novo a vertente relacional do marketing. E aí, tanto comunistas como bloquistas sabem que ao longo do ano (ou seja, ao longo da relação) não podem andar a dizer bem do Governo porque o seu posicionamento no mercado é de combate e de reivindicação. Por isso, adotam uma estratégia do "dois em um": por um lado, regozijam-se com os benefícios sociais que conseguiram obter nas negociações para o OE; mas, por outro, criticam o Governo por não ter ido mais além nesses apoios e pela política de cativações entretanto implementada.
É, provavelmente, por terem um "posicionamento desfocado" que o PCP e o BE têm sido penalizados de forma significativa nos últimos atos eleitorais. Na prática, ao fazerem parte da solução governativa, deixaram de ser fiéis à sua "proposta de valor" tradicional - isto é, à sua matriz ideológica. Sim, porque tanto Jerónimo de Sousa como Catarina Martins já concluíram (talvez esta primeiro do que aquele) que a geringonça foi a pior coisa que poderia ter acontecido aos respetivos partidos.
Quanto ao PS e ao Governo, não têm de se preocupar. O Orçamento do Estado vai ser de novo viabilizado pela esquerda que também já percebeu que não o fazer seria cometer suicídio. É que com os desaires que têm tido nas urnas, não há grande margem de manobra para perderem eleitores.
Por último, os partidos mais à direita do espetro político continuam sem fazer nada. Esperam apenas que o poder lhes caia nas mãos. O que, aliás, vai acontecer, não porque tenham uma fantástica estratégia de marketing político, mas porque pura e simplesmente a atual solução governativa se está a esgotar. Claro que há a "garrafa de oxigénio" chamada PRR. A dúvida é saber quanto tempo vai a sua ilusão durar...
Carlos Brito, docente convidado da Porto Business School e codiretor da Pós-Graduação em Maketing Management.Artigo originalmente publicado no Dinheiro Vivo a 09.10.2021