Como é que a felicidade pode influenciar o nosso desempenho numa empresa? Será que a felicidade também se treina? Isabel Paiva de Sousa, investigadora (a relação entre a felicidade e a performance que está na origem da sua tese de doutoramento) e docente da Porto Business School, acredita que sim e que, apesar das boas práticas nas empresas, ainda é necessário trabalhar as competências ligadas ao bem-estar com vista à obtenção de melhores resultados.
Não existe uma fórmula mágica, nem um kit "chave na mão" para a gestão de pessoas, de forma eficaz, nas empresas mas, esta questão tem sido estudada há vários anos - Como é que o bem-estar e felicidade dos colaboradores de uma empresa influencia o seu desempenho?
Com experiência de quase 30 anos na área da gestão nos setores automóvel, têxtil, retalho e dos serviços, Isabel Paiva de Sousa conciliou sempre a atividade profissional com a docência nas áreas comportamental, de liderança e comunicação e, há quase uma década, também à investigação da relação entre a felicidade e a performance das empresas.
Com base na investigação desenvolvida nesta área, e que está na base da sua tese de doutoramento, Isabel Paiva de Sousa acredita que as empresas que apresentam maiores índices de felicidade e de bem-estar são mais produtivas. E a felicidade também se treina. De que forma? Treinando as nossas forças e virtudes, aquilo em que somos bons e ampliando estas virtudes, de uma forma sustentável. “Isto vai ampliar os nossos níveis de confiança, por isso, também temos capacidade para ousar mais, abraçar novos desafios, olhar para eles de uma forma mais construtiva e perceber o que é que eu posso crescer com isto”, explica a docente e diretora do programa Resiliência para Resultados, da Porto Business School (PBS).
Para perceber se a performance numa organização está relacionada com bons índices de felicidade, a investigadora desenvolveu um programa de treino para medir o capital psicológico positivo, sendo este constituído pelas seguintes competências: autoeficácia, a esperança, o otimismo e a resiliência, para avaliar o impacto na gestão das emoções, a satisfação na empresa e o contributo dos colaboradores para a organização.
O treino destas competências é sempre numa lógica de sustentabilidade, de diversidade, na qual é essencial haver a dialética entre positivo e negativo numa empresa, porque equipas que sejam só otimistas, sem elementos pessimistas, “podem tornar-se irrealistas”, adianta Isabel Paiva de Sousa.
Os resultados do programa, aplicado no setor da banca e no âmbito do doutoramento na Faculdade de Economia da Universidade do Porto (FEP), revelaram que as pessoas com maior capital psicológico positivo, isto é, que têm maiores níveis de autoeficácia, esperança, otimismo e resiliência, são pessoas com melhores níveis de bem-estar e de envolvimento com a empresa.
“O nosso objetivo é conseguir que as pessoas cresçam como indivíduos, vivam melhor naquilo que estão a fazer, por isso, a lógica do bem-estar está inerente a este desafio. Sentirem que aquilo que estão a entregar e o que estão a receber está a fazê-los dar o seu melhor”, explica.
“Vestir a camisola não chega, é preciso suá-la”
A investigadora e docente da Porto Business School acredita que as empresas portuguesas estão no bom caminho e já têm adotado boas práticas, através da criação de momentos de identidade e de contágio emocional, do reconhecimento do desempenho dos colaboradores, de experiências de desenvolvimento de competências com recurso a equipas multiculturais e multidisciplinares.
Mas não chega. É preciso uma maior aposta na cultura de feedback permanente e sustentável, numa lógica de perceção se o trabalho executado corresponde às expetativas, tanto das empresas como dos colaboradores, defende a investigadora, assim como a criação de “agentes de mudança ou embaixadores de mudança” nas organizações que inspirem os seus pares dentro na empresa, que “vão contagiando e vão permitindo trabalhar os outros para que a mudança possa acontecer”.
Isabel Paiva de Sousa acredita ainda que é crucial trabalhar noutra dimensão da felicidade e do bem-estar relacionada com sentido e o significado do trabalho, “o propósito” dos colaboradores e qual é o seu contributo para esta missão. “Este é um dos grandes desafios da gestão: como é que eu consigo que, cada uma das pessoas das minhas equipas, vivenciem estes valores e sintam a organização como sendo sua, numa lógica de zelar também pelo património empresarial como sendo seu”, defende Isabel Paiva de Sousa.
“Vestir a camisola não chega, é preciso suá-la”, compara. E exemplifica: “Quando redefinimos as estratégias, partilhamos a renovação da marca, partilhamos o posicionamento do negócio, até que ponto é que nós suamos a camisola? Até que ponto é que nós deixamos algo de nosso também lá? Quanto é que eu me identifico com aquilo que a empresa propõe ser? Quanto é que eu sinto que aquilo que eu dou também recebo numa lógica win-win?”, questiona.
A diretora do programa Resiliência para Resultados, que tem início a 16 de novembro, sublinha a importância dos colaboradores de uma empresa perceberem qual é o seu propósito como indivíduos, de que forma é que o trabalho dá sentido às suas vidas, sentem que contribuem para algo maior do que eles próprios, que para que estejam em sintonia com o propósito da organização.
O programa está muito centrado no treino cognitivo, ou seja, na maneira como percecionamos a realidade, a maneira como nós pensamos, na gestão das nossas emoções e no treino da atenção, tanto a atenção focada que potencia a eficiência, como da atenção aberta, que amplia o pensamento nos domínios da criatividade.
No programa “trabalhamos os quatro domínios da resiliência: a confiança, o networking, a adaptabilidade e o propósito. Tentar perceber como é que sou, como posso otimizar as minhas forças e virtudes, em que contexto, como é que eu penso, que significados dou ao que acontece e como é que percebo o que me alavanca, o que me dá vontade, o que é que me mobiliza e faz querer saber mais, assim como também perceber o que me debilita e angustia. Trabalhamos muito a lógica da inteligência emocional, da empatia, do saber expressar gratidão. Treinamos a adaptabilidade, o saber aprender com o erro, a importância da busca incessante do conhecimento em diferentes domínios. Para além do treino individual, desenvolvemos um conjunto de práticas de gestão para tornar as equipas mais resilientes”, conclui Isabel Paiva de Sousa.