Portugal na rota da economia circular por um mundo mais sustentável
O modelo da economia circular poderá substituir a curto, médio prazo o modelo tradicional económico, com vista a uma sociedade sem desperdício, alicerçada em práticas de produção e consumo sustentáveis. A implementação de medidas na Europa até 2030 terá um impacto positivo de 1,8 mil milhões de euros, permitirá a criação de 1 a 3 milhões de empregos e uma redução de 2 a 4% do total anual de emissões de gases de efeito de estufa.
A economia circular surge como uma alternativa mais eficiente do ponto de vista ambiental e da gestão de resíduos, numa lógica de economia sustentável. Com este modelo económico, alternativo à economia linear, não estamos apenas a produzir, consumir e gerar lixo, mas sim a reutilizar e a reciclar após o consumo. Ou seja, o capital extraído é preservado, restaurado e reintroduzido no sistema ciclicamente, gerando um maior retorno financeiro para o produtor, reduzindo custos de extração e importação de matérias-primas e os seus impactos nos ecossistemas), minimizando resíduos e as emissões associadas.
Em Portugal já se começam a dar os primeiros passos rumo à adoção de um modelo económico mais sustentável na cadeia de valor e para o ambiente, seguindo as diretrizes europeias legisladas desde 2015. Além dos apoios a projetos que visem a implementação de modelos de negócio, produtos ou serviços assentes no modelo da economia circular, há associações que estão no terreno com a missão de acelerar a transição para a economia circular no nosso país.
A Circular Economy Portugal – CEP, uma associação sem fins lucrativos, é um desses exemplos que têm contribuído para construir uma sociedade sem desperdício, assente em práticas de produção e consumo sustentáveis, fruto da ação colaborativa na criação de soluções para problemas socio-ambientais. A fundadora, Lindsey Wuisan, quis trazer para Portugal a experiência adquirida na Holanda, líder internacional em matéria de economia circular, onde esteve envolvida no primeiro programa de política nacional sobre economia circular.
A CEP acredita que, em Portugal, determinados setores críticos têm muito a ganhar com as abordagens da economia circular, nomeadamente no abastecimento e reutilização de água, sobretudo pelos problemas de escassez que se vão agravar, fruto da desertificação e das alterações climáticas. “O setor agrícola, o maior consumidor de água, tem perdas na ordem dos 37,5%. No que diz respeito à reutilização de água estamos muito atrás de Espanha ou de Itália. A agricultura nacional, que se debate com o problema da pobreza dos solos em matéria orgânica (70% das superfícies agrícolas), beneficiaria imenso de uma política séria de recolha e compostagem dos resíduos orgânicos domésticos”, defende Andreia Barbosa, membro da CEP.
Outro exemplo é o setor da construção, um dos maiores consumidores de materiais e dos que mais resíduos gera, contribuindo para 40% do total nacional. “Aqui é urgente introduzir estratégias de reutilização”, continua a representante da associação defensora da implementação da economia circular no nosso país.
Além disso, no caso específico de Portugal, a produtividade material do país é baixa, sobretudo quando comparada com a vizinha Espanha que cresceu 134% entre 2005 e 2015, enquanto o nosso país ficou nos 23%, sustenta a CEP. Geramos 1,10 euros de valor (PIB) por quilograma de matéria-prima utilizada, enquanto a média da União Europeia é de 2 euros. Na opinião de Andreia Barbosa é importante “introduzir estratégias que permitam reduzir a extração e entrada de materiais, e ao mesmo tempo aumentar o valor deles”.
Medidas da economia circular com impacto de 1,8 mil milhões de euros na Europa
A Comissão Europeia adotou, em 2015, um pacote legislativo destinado à transição para uma economia circular na União Europeia. Além das propostas legislativas sobre resíduos e metas destinadas a estimular o desvio de opções de eliminação e a reforçar a reutilização e a reciclagem, foi também elaborado um Plano de Ação para a Economia Circular como suporte a toda a cadeia de valor, desde a produção ao consumo, reparação, manufatura, gestão de resíduos e matérias-primas secundárias.
Os dados indicam que atualmente consumimos cerca de 62 mil milhões de toneladas de recursos por ano, dos quais apenas reciclamos 7%. Em 2050, iremos consumir entre 85 a 186 mil milhões de toneladas para alimentar uma economia global com 9 mil milhões de pessoas.
A implementação de medidas na Europa até 2030 terá um impacto positivo de 1,8 mil milhões de euros, de 1 a 3 milhões de empregos e uma redução de 2 a 4% do total anual de emissões de gases de efeito de estufa. Em Portugal, implementar esta estratégia pode permitir uma redução de cerca de 30% nas necessidades de matérias-primas, gerando um impacto positivo no Valor Acrescentado Bruto, estimado em 3,3 mil milhões de euros.
As metas da Comissão Europeia são ambiciosas: 80% para a reciclagem de resíduos de embalagens na UE até 2030; 65%, para os resíduos orgânicos até 2025 e ainda uma redução em 50%, resíduos alimentares produzidos e do lixo marinho até 2030. Em 2014, Portugal só reciclou 30% dos seus resíduos, bem abaixo da média europeia situada em 44%, e depositou quase metade de todos os resíduos em aterros (49% versus 28% de média da UE).
A CEP aplaude as propostas da UE com vista à implementação de medidas de dinamização da economia circular tendo, no entanto, algumas dúvidas quanto à “capacidade e ambição dos diferentes países para a tradução nas suas políticas nacionais das medidas do plano, e nomeadamente a hierarquização correta das prioridades: mais do que as metas de reciclagem importam as metas de redução dos consumos e de prevenção dos desperdícios”.