Refletir sobre um cenário de turnaround é refletir sobre a capacidade de sobreviver de uma empresa. Boas práticas de corporate governance e as principais competências do CEO são determinantes para o sucesso, quando a missão é assegurar a sobrevivência da empresa.
A reflexão é de Filipe Morais, Professor de Governance e Reputação na Henley Business School, em Reading, e orador de mais uma Masterclass fora da caixa promovida pela Porto Business School no dia 11 de dezembro.
Filipe Morais, Doutorado em Gestão e Professor na Henley Business School, a mais antiga do Reino Unido e a segunda mais antiga da Europa, há mais de uma década. A sua vasta experiência em Corporate Governance, em conjunto com o seu conhecimento e proximidade da indústria, torna a sua investigação relevante, fundamentada e atual.
Em julho de 2020, Filipe Morais, em parceria com Andrew Kakabadse e Gerry Brown, publicou o livro “The Independent Director in Society” que, pela primeira vez, analisa a crise de governação em toda a sociedade, em vez de se focar apenas no setor empresarial. Para os autores, apesar das suas singularidades, todas as organizações partilham alguns comportamentos e desafios.
Nesta masterclass, Filipe Morais abordou as principais responsabilidades e expectativas do papel do CEO num cenário de turnaround. O orador convidou os participantes a refletir sobre os desafios, tensões e escolhas do CEO que se revelam determinantes num contexto de turnaround que coloca a sobrevivência da organização em questão.
As causas que conduzem a um cenário de turnaround podem ser graduais ou repentinas; impulsionadas pela dissolução do negócio ou mercado envolvente ou por um colapso inesperado (à semelhança do que aconteceu, por exemplo, em março/ abril de 2020 com o setor da aviação em consequência das medidas adotadas face à disseminação da pandemia Covid-19).
Para Filipe Morais a responsabilidade de evitar um cenário de turnaround é do Conselho de Administração. E neste contexto a principal causa que pode conduzir a um contexto de turnaround é interna; uma gestão inadequada, pois “é da responsabilidade do Conselho de Administração e da equipa de gestão assegurar que a empresa é resiliente o suficiente para enfrentar os choques; ágil o suficiente para acompanhar as mudanças subtis e graduais do contexto envolvente”.
A empresa alcança um patamar de sucesso confortável acompanhado de notoriedade e boa reputação e o erro está em permanecer nesse “nível de conforto”, e esquecer que a missão ainda não está concluída, pois o mundo continua a transformar-se. E neste estado de conforto, e inércia, “a empresa começa a navegar à deriva”.
Num cenário de turnaround, o papel do CEO é crucial. A primeira coisa é ganhar tempo, ou seja, “dialogar com os credores e negociar um fundo de emergência para a empresa se manter à tona” e a segunda é decidir se tem ou não a equipa adequada para o processo de turnaround. Neste patamar o Conselho de Administração tem também de decidir se confia ou não no CEO para o processo de turnaround.
O papel do CEO num processo de turnaround abrange quatro áreas fundamentais: liderança e equipa; estratégia; estrutura organizacional; e comunicação.
1. Construir e liderar a equipa de liderança de topo:
Neste domínio o grande desafio consiste em decidir entre continuidade e mudança, ou seja, determinar quais são as áreas da empresa que necessitam de continuidade (manter a equipa atual) e as áreas que precisam de mudança (ir buscar sangue novo ao mercado).
2. Definir a estratégia:
Nesta área o CEO tem em mãos três grandes desafios: articular o propósito do negócio, determinar as competências únicas do negócio e a sua vantagem competitiva e definir o ritmo e escala da mudança.
Neste contexto é importante ter em consideração que a agressividade temporal tem um efeito positivo no desempenho do processo de turnaround, ou seja, a empresa tem maior probabilidade de superar. A agressividade de volume, ou seja, uma avalanche de mudanças, tem um efeito negativo no desempenho.
3. Remodelar a estrutura organizacional:
Redução e recuperação são abordagens contraditórias, contudo complementares num modelo bifacetado de turnaround. Saber dosear as duas abordagens numa metodologia de alternância ou simultaneidade pode determinar a sobrevivência e superação da empresa.
É importante avaliar e reduzir a capacidade, riscos e recursos para explorar mais eficientemente os ativos existentes. Mas é também importante, no momento certo, aumentar a capacidade, o nível de risco e mais recursos com o objetivo de explorar novos mercados e/ou novos produtos e serviços.
4. Comunicação do CEO:
O CEO deve assumir esta comunicação à equipa; deve ser ele a falar diretamente com a equipa.
Partilhar a informação necessária com os colaboradores, para que compreendam onde estão e porquê e os sacrifícios que têm de ser feitos com o objetivo de garantir a sobrevivência da empresa.
Mensagens simples e focadas para assegurar que todos compreendem a urgência da mudança.
Liderar, planear, renovar e comunicar são quatro competências fundamentais do CEO, transformando-se em competências de sobrevivência num cenário de turnaround.
Fontes:
Schmidt, A., Barker, Vincent L., Raisch, Sebastian, Whetten, David (2015), “Strategic Renewal in Times of Environmental Scarcity”, Long Range Planning, 49, pp. 361-376
Tushman, M. L., Smith, W. K., and Binns, A. (2011), “The ambidextrous CEO”, Harvard Business Review, June Issue (adapted)
Barbero, J. L., Martinez, J. A. and Moreno, A. M. (2020), “Should declining firms be aggressive during the retrenchment”, Journal of Management
Arogyaswamy, K., Barker, V. L., Yasai-Ardekani, Masoud, (1995), “Firms turnarounds: an integrative two-stage model”, Journal of Management Studies, 32 (4), pp. 493-525