Os desafios na captação e retenção de talento, a relevância da flexibilidade, a gestão de equipas multigeracionais e a emergência de novos modelos de trabalho são temas quentes no domínio da gestão de talento.
Estivemos à conversa com Adelaide Martins, codiretora da Pós-Graduação de Gestão de Pessoas.
Com a idade para a reforma a aumentar, as equipas são cada vez mais multigeracionais. Que tipo de recomendações sugere para a gestão destas equipas?
Gosto muito deste tema, pois constitui um desafio interessantíssimo no âmbito da Gestão de Pessoas. Vejo-o mais na perspetiva da Gestão da Diversidade do que da gestão de “faixas etárias”, pois a realidade comprovou-me que é a atitude perante o trabalho que define o tipo de profissional que somos e que a atitude não está ancorada na idade cronológica, mas no perfil pessoal. Temos exemplos fantásticos de profissionais de excelência em todas as idades e de seniores que mantêm uma atitude jovem até ao fim das suas carreiras, de constante abertura, aprendizagem, colaboração, disponibilidade, flexibilidade e partilha.
A Gestão da Diversidade constitui uma oportunidade no âmbito da gestão do talento, porque está comprovado que, bem gerida, respeitando as diferenças e com empatia, para além de outras vantagens, contribui para a satisfação e motivação das equipas, para o aumento da criatividade, capacidade de resolução de problemas e o atingimento de melhores resultados.
É necessário identificar as competências e os pontos fortes de cada colaborador e garantir que, através da metodologia que melhor se adaptar a cada organização – mentoring/tutoria, reverse mentoring, etc. – são partilhadas com os outros elementos da equipa as melhores qualidades e experiências de cada um, o que também assegura, na continuidade, a transmissão e a retenção do conhecimento do negócio.
Para suporte ao diagnóstico do talento, à gestão das atividades das equipas, acompanhamento da implementação dos planos de ação e grau de cumprimento das atividades, é importante também dispor de suporte tecnológico que facilite e agilize esta gestão, existindo software para este efeito que permite caracterizar as informações relativas aos colaboradores e suportar as atividades a desenvolver, o que contribui para a melhor gestão das equipas multigeracionais.
É fundamental fomentar a comunicação informal e formal, por exemplo, através de reuniões, grupos de trabalho, momentos de partilha, talks, ações de formação asseguradas pelos colaboradores, planos de desenvolvimento da equipa, que garantem também a transmissão do Propósito, Cultura e Valores da empresa.
Implementar equipas multigeracionais é um ato de inteligência, pois funde de forma muito positiva diversos tipos de conhecimento, de experiências, competências, atitudes, energias, e flexibilidade, em que todos aprendem com todos e as empresas ganham um valor acrescentado.
A pandemia trouxe-nos desafios, aprendizagens e novos modelos de trabalho. Será que o trabalho remoto veio mesmo para ficar? Quais são as grandes dificuldades na gestão destas equipas?
Não sendo uma novidade decorrente da pandemia, diria que o teletrabalho foi uma descoberta, maioritariamente positiva, para grande parte dos colaboradores que foram forçados a fazê-lo aquando dos confinamentos obrigatórios e também para as respetivas empresas.
Algumas, particularmente as tecnológicas, já o tinham adotado, mas não representavam a maioria, como sucede atualmente em todas as áreas de atividade, incluindo a função pública.
Creio que não existem dúvidas de que o trabalho remoto veio para ficar, particularmente numa época em que a flexibilidade, o equilíbrio e a qualidade de vida são valorizados, o ambiente chama pela nossa atenção e faz-nos querer diminuir a pegada ecológica e, consequentemente, os custos e o tempo das deslocações. Os modelos híbridos reúnem a maioria dos adeptos, mas o modo da sua implementação será diverso e o número de dias variável, conforme o tipo de gestão e cultura de cada empresa.
Contudo, como sabemos, já existem empresas que não têm instalações físicas, com todas as atividades e interações a decorrerem no plano digital e com apenas alguns encontros presenciais pontuais das equipas, sendo o teletrabalho a regra na modalidade plena. Outras, tendo instalações físicas, estas são flexíveis, não tendo capacidade para a totalidade dos colaboradores, vigorando a modalidade hot seat/hot desking, com ou sem marcação prévia, com alternância dos dias de presença no espaço físico.
Comportando vantagens variadas para o colaborador e para a empresa, constata-se que esta modalidade de organização do trabalho também tem associadas algumas desvantagens, particularmente se não adaptarmos a gestão da equipa às especificidades daí decorrentes e continuarmos a fazer a sua gestão nos mesmos moldes em que é feita quando todos estão presentes no mesmo espaço.
Também o colaborador tem de atender a alguns princípios para evitar essas desvantagens, pois está comprovado que é difícil separar o trabalho da vida pessoal, quando ambos ocorrem no mesmo espaço e também evitar o sentimento de isolamento, com consequências negativas de diversos tipos, nomeadamente ao nível do bem-estar pessoal e familiar e da saúde mental.
Por sua vez, é mais desafiante para os gestores das equipas criar o espírito de grupo e de missão, quando as pessoas não partilham o mesmo espaço e não interagem pessoalmente — não tomam um café, não vão almoçar juntas e apenas se conhecem “pela metade” no mundo digital e em encontros pontuais, dificultando a criação de uma conexão forte. Esta realidade torna, por vezes, a comunicação mais lenta e mais pobre, pois perde-se parte da comunicação não verbal (particularmente quando os participantes, nas reuniões digitais, desligam as câmaras).
Mas sendo o teletrabalho aparentemente incontornável, a gestão destas equipas terá de contar com uma comunicação regular eficiente, usando profusamente os canais que forem escolhidos, que, em conjunto, com iniciativas adequadas, ajude a manter a equipa unida, motivada e alinhada com a cultura da empresa, com particular incidência na fase delicada de integração de novos colaboradores remotos. Será também necessário implementar tecnologia adequada e medidas de acompanhamento da produtividade, que permitam intervir e corrigir os desvios, se necessário. Será igualmente importante estar particularmente atento às questões da saúde e do bem-estar, com especial enfoque na saúde mental e emocional dos colaboradores, nomeadamente estando atento ao trabalho realizado recorrentemente em horário pessoal. Será também necessário definir dias, em que as equipas se reúnem presencialmente para reuniões de acompanhamento da atividade, de feedback ou formação, que funcionam também como momentos de ligação da equipa, contribuindo, assim, para a manutenção do seu funcionamento ótimo.
Na área da gestão de pessoas um dos temas quentes e que tem admiradores e detratores é o tema da semana de 4 dias. Este é um grande desafio para os gestores de recursos humanos.
Quais são os entraves mais significativos para a implementação deste novo modelo?
Como poderemos compensar os colaboradores cujo tipo de trabalho não se enquadra neste modelo?
É um tema em estudo e discussão, que acredito estar ainda longe da sua eventual implementação. Trata-se de inovar na forma de organização do trabalho, comporta vantagens e desvantagens e divide opiniões. Há também quem defenda que, por efeito reflexo, esta medida poderá dar um novo impulso à indústria do lazer face a mais um dia que ficaria liberto para tempo pessoal.
A evolução da quarta revolução industrial, o desenvolvimento da tecnologia e a implementação da inteligência artificial poderão contribuir para dispensar cada vez mais o humano dos locais de trabalho.
Pretende-se a redução do horário semanal com o aumento da qualidade de vida e a manutenção da produtividade das empresas. Diversos países estão a testar a sua implementação, com variações na composição horária e na remuneração e com resultados distintos.
Genericamente, o Código de Trabalho português não define um mínimo de horas semanais, apenas estabelece, para todos os setores, um máximo semanal de 40 horas, podendo ser distribuídas por oito horas diárias ou ser implementado o regime de adaptabilidade ou de horário flexível.
Alguns dos entraves mais significativos para a implementação deste novo modelo decorrem de não ser aplicável a todas as empresas; ser de difícil adaptação face aos modelos atualmente em vigor; da capacidade de garantir que a produtividade não é afetada e que os clientes não perdem a atenção que lhes é dedicada.
Estando ainda em estudo, para, eventualmente, compensar empresas e colaboradores cujo tipo de trabalho não se enquadra neste modelo, que não é, de todo, consensual, terão de ser encontradas soluções legislativas e incentivos.
Em tempos de incerteza e constante transformação quer individual quer organizacional, partilhe connosco o tipo de líder ideal para a gestão de pessoas.
Considero que no atual contexto, a área da gestão mais exigente e que comporta o maior desafio, é a da Gestão de Pessoas. Face à escassez de recursos qualificados e à mudança verificada na atitude e na gestão de expectativas dos candidatos/colaboradores, muitos paradigmas da Gestão de Pessoas estão em transformação.
Acresce que, perante a imprevisibilidade da realidade futura, nunca estaremos totalmente preparados para a enfrentar, pois conseguirá, eventualmente, surpreender-nos de forma inesperada, tal como sucedeu com a pandemia COVID-19.
A recente crise atingiu-nos de forma imprevisível e com impacto direto e sem precedentes no mundo do trabalho e na sociedade em geral, sendo inevitável que, em resposta, estejam a ocorrer mudanças estruturais, com forte suporte em tecnologia, que tornem as empresas e as equipas mais ágeis, com processos mais simplificados e flexíveis, com mais colaboração e com capacidade de resposta mais rápida. Tal realidade exige de todos nós, que ocupamos cargos de gestão, uma capacidade muito para além do habitual para lidar com um contexto, que para além de incerto, volátil, complexo e ambíguo é também frágil, ansioso, não-linear e incompreensível (*), com melhores soluções e maior capacidade de elaboração do pensamento crítico, com menos informação.
As lideranças estão a ser desafiadas permanentemente, pelo que o tipo de líder ideal para a gestão de pessoas está necessariamente em permanente evolução. Para gerir em contexto de turbulência, e garantir maior sucesso neste desafio, ganhando as pessoas e mantendo a motivação das equipas, o líder ideal terá de ser visionário, ter sentido de humor e atitude positiva, ser comprometido e apaixonado pelo que faz, ser criativo e de aprender constantemente.
Além disso, o líder ideal terá de ser capaz de exercitar uma comunicação constante, de ter a capacidade de decisão e resolução de problemas, saber gerir conflitos com flexibilidade e tolerância, de ser integro, preocupar-se com os outros e de ser resiliente.
Adelaide Martins, codiretora da Pós-Graduação de Gestão de Pessoas.
(*) Corresponde ao novo acrónimo – BANI – que representa os termos Brittle, Anxious, Nonlinear e Incomprehensible [frágil, ansioso, não-linear e incompreensível] e pretende responder, na opinião de Jamais Cascio, à era de verdadeiro caos em que presentemente nos movemos.