Filosoficamente, o mundo pode nunca mais ser o mesmo. Esta experiência em massa de teletrabalho pode vir a ser uma experiência social que poucas empresas jamais teriam empreendido em tal escala. Será que alguma vez regressaremos ao nosso trabalho da mesma maneira?
Em todo o mundo, as empresas implementaram políticas obrigatórias de teletrabalho como um meio de evitar a disseminação do Covid-19. Para muitos de nós, trabalhar em casa é algo novo e difícil e os principais desafios enquadram-se, sobretudo, em duas categorias: a execução das tarefas e a interação social. Os maiores desafios na execução das tarefas são a comunicação e a partilha de informação entre colaboradores quando não estão no mesmo espaço. Um desafio associado a este é o da ativação desta colaboração, à distância. Mas trabalhar em casa cria também um desafio social, separando-nos dos nossos colegas de trabalho, uma mudança que pode criar uma sensação de isolamento.
Trabalhar a partir de casa pode parecer desestruturado e confuso. Ao trabalhar no escritório, deslocamo-nos para o trabalho e isso dá-nos estrutura e cria limites claros do dia de trabalho. Em paralelo, fornece tempo para que a nossa mente possa fazer o"switch". Ao trabalhar em casa, é difícil separar a vida profissional da vida familiar. A nossa deslocação consiste apenas em mudar de uma divisão para outra, sem o tempo necessário para "desconectar". Além disso, com as crianças em casa, é fácil distrair-se e mais difícil concentrar-se no trabalho.
No ano passado, a agência de desenvolvimento de marcas online Buffer realizou um estudo sobre as dificuldades de trabalhar remotamente. Após um inquérito a mais de 2.500 pessoas em trabalho remoto, descobriram que a incapacidade de “desligar” (“Unplugging after work”) era o desafio mais relatado (22% dos entrevistados). A "solidão" foi o segundo desafio mais relatado (19%). "Colaboração e comunicação" foi o terceiro (17%). "Distrações em casa" ficou em quarto lugar (10%). Mas estes são dados do ano passado, num contexto em que as escolas não estavam fechadas por causa do Covid19. Fosse esta pesquisa realizada hoje, a percentagem associada a “Distrações em casa” provavelmente seria muito maior.
A imposição abrupta desta transição (de um escritório para um ambiente doméstico), deixa as pessoas em dificuldades. Então, o que podemos fazer para enfrentar todos esses obstáculos?
Para começar, precisamos tratar o trabalho à distância como um verdadeiro trabalho. Começa com a estruturação do dia de trabalho. Só porque podemos andar de pijama, não significa que devemos fazê-lo. Em vez ficarmos deitados na cama com o computador, devemo-nos levantar, tomar um banho e vestir. Precisamos tratar o teletrabalho como um trabalho sério. Ir para um espaço afastado das distrações, sentar numa cadeira e ligar o computador, tal como faríamos na secretária do escritório.
Isto serve também como um sinal importante, para quem mora consigo, de que está "no trabalho". Deve criar limites em casa que sejam entendidos pela sua família. Por exemplo, quando a porta estiver fechada, finja que não está lá. Tem de se colocar num estado de espírito em que está realmente a trabalhar.
É também importante colocar limites ao seu dia de trabalho. Se não mudar para um escritório físico ou entrar ou sair de um escritório físico, o que fornece limites mais claros para a jornada de trabalho, deve criar “alterações psicológicas” para desligar, afastar-se e colocar-se no “mindset” correto: uma pausa para o café, algum exercício físico no início e final do dia, ou mesmo sair um pouco e andar.
Com coronavírus ou não, a chave para trabalhar em casa passa por uma comunicação clara e frequente (com seu chefe e sua equipa) e por saber exatamente o que deve fazer. Deve tentar ter comunicações pré-estabelecidas diariamente. Por exemplo, uma chamada para iniciar e outra para encerrar o dia.
Na Porto Business School, todos nós já estamos em modo teletrabalho há três semanas. A equipa de gestão inicia o dia com uma chamada, todas as manhãs, às 9h, para discutir as questões mais urgentes, tomar decisões e ajustar-se à situação de crise e sua evolução. Em seguida, convocamos outras equipas para discutir e decidir sobre questões específicas relativas a diferentes funções ou unidades de negócio. Estamos também em contato com os alunos dos nossos programas e com os professores, para obter feedback sobre a sua experiência com as aulas online e a adaptação geral à nova realidade. E, uma vez por semana, também temos uma reunião virtual informal com todos os colaboradores. É uma oportunidade de partilhar as nossas experiências sobre o trabalho em casa, partilhar os nossos sentimentos, ver os membros da família e as crianças no ecrã e celebrar juntos as incríveis conquistas dos últimos dias.
Estes são tempos stressantes. Notícias negativas, preocupações com os nossos entes queridos, mais velhos ou doentes, a luta contra o impulso de entrar em pânico e iniciar corrida às compras de papel higiénico podem adiar a resposta a emails profissionais. Porém, quanto mais esforço dedicar à comunicação com os colegas, maior a probabilidade de evitar a sensação de isolamento. A solidão pode fazer com que as pessoas se sintam mais deprimidas, menos motivadas e menos produtivas. Especialistas dizem que a comunicação de "alta fidelidade", como as videochamadas, ajuda a combater o isolamento e a garantir um sentimento de união e a produtividade da equipa.
Se chefia equipas, reconheça que existe stress e dificuldades. Cabe a si garantir uma comunicação clara. É também crucial manter o ânimo. Por isso, tente manter um estado de espírito positivo. Pode manter uma sensação de normalidade e companheirismo de formas menos convencionais: celebrar aniversários, elogiar publicamente por metas alcançadas e projetos concluídos, reservar tempo para conversas casuais ou até promover “happy hours” remotos, em que as pessoas possam tomar uma bebida em conjunto, através do Skype.
Filosoficamente, o mundo pode nunca mais ser o mesmo. Esta experiência em massa de teletrabalho pode vir a ser uma experiência social que poucas empresas jamais teriam empreendido em tal escala. Será que alguma vez regressaremos ao nosso trabalho da mesma maneira?
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