A economia circular destaca a importância da adoção de uma perspetiva sistémica, já que esta mesma perspectiva é, na sua base, uma abordagem em que um ciclo se autoalimenta, sendo por isso extremamente necessário compreender e otimizar cada uma das etapas do processo. Este artigo realça três abordagens de como o Systemic Thinking é muitas vezes usado para estes mesmos processos, otimizando-os e criando valor.
A relação entre Systemic Thinking e Economia Circular
O pensamento sistémico é uma forma de compreender o mundo à nossa volta, vendo a interligação e as relações em vez de partes isoladas. Implica ter uma visão holística de um sistema, analisar os seus componentes e compreender como se relacionam uns com os outros para criar um todo complexo e dinâmico.
Já a economia circular é um sistema económico baseado na reutilização e regeneração de materiais ou produtos, especialmente como modo de continuar a produção de uma forma sustentável ou amiga do ambiente. Isto é conseguido através da concepção de produtos e serviços que podem ser facilmente reutilizados, reparados e reciclados, bem como através da implementação de sistemas que permitem a recuperação e a regeneração de materiais e recursos. Ou seja, numa economia circular o lixo é visto como um recurso valioso, que pode ser utilizado para criar novos produtos e serviços, e não como algo a ser eliminado.
O pensamento sistémico e os processos da economia circular estão intimamente ligados. No cerne de uma economia circular está o entendimento de que as várias partes trabalham como elementos de uma cadeia interligada, sendo que todas as partes são consideradas a com o objectivo de alcançar a sustentabilidade. O pensamento sistémico é, portanto, uma ferramenta poderosa para conceber e implementar processos de economia circular que sejam eficazes, eficientes e sustentáveis. Por fim, o pensamento sistémico permite também navegar entre os diferentes níveis de complexidade dos modelos económicos, desde a gestão e extração de recursos ao mais elementar comportamento humano.
Compreender melhor relações e dependências
Mapear um sistema é um exercício essencial no pensamento sistémico, sendo aplicado a processos de economia circular para identificar os componentes, processos, e relações que compõem esse mesmo sistema. Este exercício envolve a decomposição do sistema nos seus componentes individuais e a identificação da forma como interagem entre si. O objetivo é criar uma representação visual do sistema que destaque os componentes-chave, as suas interdependências e a forma como contribuem para o sistema global.
Numa economia circular, o mapeamento do sistema envolveria a identificação dos componentes-chave, tais como a conceção do produto, fabrico, distribuição, consumo e processos de fim de vida, mas principalmente na identificação de ramificações escondidas que podem gerar disfunções ou otimizações desse mesmo sistema. Compreender em grande escala, fatores que vão para além da óbvia sequência linear e que nos permitem compreender fatores de risco e assim mitigar a exposição aos mesmos, quer pela criação de elementos de resiliência, quer por alterações por oportunidade.
Ao mapear o sistema, mais do que tornar possível compreender como são gerados os resíduos, onde residem as ineficiências e como os recursos podem ser mantidos em uso durante o máximo de tempo possível, compreendemos que novas oportunidades e riscos estão a surgir e como navegamos a complexidade para rumos mais informados.
Identificar, analisar e construir alternativas
Os loops de feedback são processos circulares que ocorrem dentro de um sistema, onde as saídas de um processo se tornam as entradas de outro. A identificação de loops de feedback num sistema de economia circular é importante porque ajuda a identificar oportunidades para a redução de resíduos e otimização de recursos. Ao compreender como os vários componentes do sistema interagem, torna-se mais fácil identificar os circuitos de retorno que podem ser otimizados para reduzir o desperdício e melhorar a eficiência de recursos.
Um exemplo óbvio seria a conceção de produtos que podem ser facilmente desmontados, reparados, e reciclados com o objectivo de criar novas relações de feedback. Ao conceber produtos que são fáceis de reparar, torna-se mais provável que sejam reutilizados ou revendidos, o que mantém os recursos em uso durante mais tempo. Mas ao analisar os feedbacks percebemos também o impacto que os mesmos têm e se poderiam ser otimizados. O Systemic Thinking permite fazer a analise profunda a estas relações de feedback numa ótica de "zoom in" e
"zoom out" para a partir daí reavaliar relações e aprofundar o que de invisível influência essa relação.
Encontrar novos caminhos para além do óbvio
Os sistemas, quando mapeados, também têm os seus limites. A definição dos limites de um sistema de economia circular é importante para compreender o que está incluído e excluído desse mesmo sistema. Por exemplo, os limites de um sistema de economia circular podem ser definidos por uma indústria específica, como a indústria da moda, ou por uma geografia específica, como uma cidade ou um país. Ao definir os limites do sistema, torna-se mais fácil identificar os principais componentes e processos que contribuem para a geração de resíduos e ineficiências de recursos. Isto, por sua vez, ajuda a identificar as áreas onde os processos da economia circular podem ser implementados para melhorar a sustentabilidade.
Além deste processo de definição, um dos exercícios que o Systemic Thinking analisa é compreendermos se estaremos efetivamente nos limites, e como os podemos expandir. Este trabalho permite abrir novas portas e perspetivas ao alargar a rede que alimenta o sistema, para depois compreendermos os comportamentos que devem ser criados para a expansão ser a mais bem-sucedida possível.
Por fim, o Systemic Thinking tem também no seu portfólio as ferramentas para equipas transitarem entre sistemas, de uma realidade atual, para uma desejável. Sempre compreendendo que os sistemas são vivos e que por isso funcionam em constante mutação. Não podemos controlar completamente um sistema, mas com as ferramentas certas, podemos guiar o que nesse sistema estiver sobre nosso controlo.
Em conclusão, o programa Systemic Thinking for Innovation da Porto Business School permite-nos conhecer e compreender as ferramentas chave para mapear e gerir a complexidade dos sistemas com que trabalhamos, identificar oportunidades de melhoria, e antecipar e gerir consequências involuntárias. Permitindo aos participantes desenvolver soluções inovadoras que abordem os problemas do mundo real de forma abrangente, sustentável e resiliente.
Artigo de Henrique Nascimento, codiretor do Open Executive Programme Systemic Thinking for Innovation.