Uma marca “é um sinal utilizado para identificar e distinguir os produtos ou serviços de uma empresa dos produtos ou serviços de outras empresas”, assim o diz a Secretaria Geral do Ministério da Justiça, que tutela o Instituto Nacional de Propriedade Intelectual.
Uma definição “universal” quanto baste, alinhada internacionalmente com a própria “American Marketing Association”, para a qual “a brand is a name, term, design, symbol or any other feature that identifies one seller’s goods or service as distinct from those of other sellers.”
Colocar “identificar” e “diferenciar” como dois dos pilares estruturantes da marca e da sua razão de ser está, para todos os efeitos, certíssimo. Mas são evidentes as limitações desta opção para definir marca. Acima de tudo, ao ser muito pouco ambiciosa do ponto de vista da descrição da sua natureza e da relação entre as marcas e quem as “constrói” e “consome”.
Pessoalmente, gosto e acho sempre mais útil o recurso às metáforas para definir entidades complexas (como as marcas), uma vez que o desafio da definição de marca é ser capaz de desenvolver um conjunto profundo de significados que nos ajudem, realmente, a construir marcas de pessoas para pessoas.
A marca como uma “Promessa”
Uma marca é uma promessa, um compromisso da realização de alguma coisa, uma declaração, uma acção futura ou intenção de dar, cumprir, fazer acontecer ou de fazer sentir algo. Uma promessa do que as pessoas “podem esperar” com cada interacção com a marca, seja por meio da sua estratégia de comunicação, da experiência de compra ou da utilização dos seus produtos ou serviços.
E, claro, o grau de cumprimento dessa promessa determina o grau de confiança, de envolvimento, e a escolha continuada da marca pelas pessoas, que ambicionam e querem o que está a ser prometido, se identificam e para quem essa expectativa é relevante e faz sentido.
Tudo parecia bater certo e esta foi durante anos a minha metáfora de eleição. Até que deixou de ser capaz de me ajudar. E porquê?
A marca como uma promessa olha para o processo de construção e gestão de marca de “dentro para fora”, com base na perspectiva da organização. A forma como a organização vê o mundo e o seu pensamento interno são utilizados para conceber as pessoas (os consumidores) e para definir os processos e métodos que (a organização acredita) irão satisfazer as necessidades dessas pessoas – a “promessa”.
A marca como uma promessa é por isso uma metáfora “brand-centric” (e consequentemente “product-centric”) com as desvantagens associadas desta visão “egocêntrica” e “unidireccional” do mercado e do consumidor. Para além disso, prometer muito uma coisa, durante muito tempo, não é condição nem de sucesso nem de impacto.
A marca como uma “Crença”
Nas palavras de Marty Neumyer: “A brand isn’t what you say it is. It’s what they say it is”, ou seja, uma marca não é o que as pessoas que a gerem dizem que ela é, mas sim aquilo que os consumidores que a usam todos os dias dizem que é.
Assim sendo, precisamos de uma metáfora que assuma a centralidade do cliente, que considere o processo de construção e gestão de marca de “fora para dentro”, e seja por isso capaz de definir marca a partir da perspectiva do próprio consumidor. Uma metáfora genuinamente “customer-centric”.
Crença vem do Latim Credentia, de Credere, “acreditar”. Um acto de crer, de acreditar, é uma atitude de quem admite com grau variável de certeza uma coisa como “verdadeira” para si! Uma crença é uma convicção, uma construção multidimensional, mais ou menos racional, claramente emocional, que impele para uma escolha (para uma acção) e dá confiança.
Assim se percebe um dos claims mais famosos no mundo das marcas de futebol “só eu sei porque não fico em casa”, criado pelos próprios adeptos (“consumidores”) que acreditam que aquela marca é a sua marca, não importa o quê nem quem.
Para mim, hoje, uma marca é uma crença do consumidor sobre o valor que ela acrescenta para si (para a sua família, para o seu dia a dia). É aquilo que ele acredita que é melhor para si, e por isso, com convicção, a escolhe em função de outra.
Por isso, o desafio para as marcas não é prometer, é fazer acreditar.
Artigo de Gustavo Mendes, docente e diretor do programa Building Meaningful Brands da Porto Business School e Diretor de Marketing do Grupo Primor.
Artigo originalmente publicado na Marketeer a 09.06.2022