À medida que as tecnologias digitais têm vindo a modificar radicalmente a indústria, a transformação digital passou a fazer parte da agenda de todas as empresas. Mesmo antes da COVID-19, havia já a noção de que a transformação digital estava a acontecer. Milhares de milhões de euros estavam já a ser gastos em esforços de transformação para melhor servir uma força de trabalho mais informada e com mais conhecimento. A disrupção estava já em pleno andamento mas, em muitos casos, focada mais na tecnologia e menos na transformação.
A aceleração digital [não mais transformação digital], conseguida através desta mudança quase instantânea de comportamento, tanto no local de trabalho como na nossa vida diária, apresenta-se como uma oportunidade para as organizações que pensavam que até agora a transformação digital era uma opção. Agora é a única solução.
No entanto, os dados do Ranking de Competitividade Digital do IMD World Competitiveness Center, com o qual a Porto Business School colabora, em exclusividade, em Portugal, vêm demonstrar que Portugal está a perder ritmo no que toca à competitividade digital. No ranking, agora publicado, Portugal perde três posições e ocupa a 37ª posição do Ranking, mantendo a tendência decrescente dos últimos 5 anos, com exceção de 2018. Apesar de ter conseguido melhorias ligeiras nas áreas do Conhecimento e da Tecnologia, a economia nacional caiu três posições face a 2019. De acordo com os números agora conhecidos, o principal ‘calcanhar de Aquiles’ da competitividade digital de Portugal tem sido a pouca Preparação para o Futuro, com a descida da 34ª para a 41ª posição a evidenciar alguma dificuldade em transpor o Conhecimento para a realidade das empresas e a falta de Agilidade no Negócio (57º) que as empresas têm demonstrado, nomeadamente devido a baixas pontuações na Deteção de Oportunidades & Riscos (50º), no Receio do Fracasso (49º) e Uso de Big Data & Analytics (55º).
Para Rui Coutinho, Diretor Executivo de Inovação & Crescimento da Porto Business School, “Portugal precisa de acelerar, de forma decidida, o seu investimento na geração e transposição de conhecimento nas áreas digitais para as empresas. É na agilidade da gestão que está o problema mas, simultaneamente, também a solução. Por isso, cabe aos gestores portugueses compreender a importância de adotarem uma gestão mais empreendedora, mais ágil e mais adaptativa - um novo ‘darwinismo organizacional’ -, que precisa de recorrer a novas ferramentas digitais, suportar as decisões em dados e apostar, de forma clara, nas competências dos trabalhadores para o digital.” E acrescenta “Durante os últimos anos ouvimos as empresas falarem abundantemente em ‘transformação digital’. É verdade que muito foi investido no digital; mas a palavra mais importante nesse novo mantra das empresas deveria ter sido ‘transformação’. E aí, está quase tudo por fazer.”
Para Sílvio Meira, docente convidado da Porto Business School, a Covid-19 veio apenas dar um sentido de urgência à transformação digital. Segundo o professor do The Digital MBA, num webinar promovido recentemente pela Porto Business School "esta coisa da digitalização tem vindo a acontecer há 50 anos. Começou nos anos 80, com os documentos electrónicos nas redes privadas digitais (...) e neste momento [2020's] estamos a começar a ver crescer economias ou ecossistemas de plataformas. Para a maioria das pessoas que estavam a prestar atenção ao que estava a acontecer, esta transformação aconteceu de facto, nas últimas 5 décadas. Mas, para algumas pessoas, aconteceu de repente, em 5 semanas".
As empresas que estão agora a entrar na competitividade digital precisam de compreender que esta transformação não pode estar presente apenas na tecnologia ou na forma como vendemos produtos/serviços. Precisa de ir mais fundo e abranger a organização como um todo. Contudo, para que isto aconteça, a mudança digital não pode ter apenas impacto no departamento de TI, precisa de estar presente em todos os departamentos e em todos os funcionários. “É uma mudança na cultura”, afirmou Ana Casaca, Head of Commercial and Innovation da Galp e docente convidada no The Digital MBA, durante o webinar “Transformação Digital: Desafios e Oportunidades” - que a Porto Business School promoveu no passado dia 17 de setembro.”
"Transformação digital é apenas 1% de tecnologia e 99% de psicologia"
Para Ana Casaca, a mudança tem de acontecer sobretudo no minset de todos os que fazem parte da organização. A transformação digital implica a alteração de processos para incorporar tecnologia e tornar o modelo de negócio mais digital, mas antes disso é crucial que cada negócio defina a sua missão, que tipo de cultura pretende ter e o que isso significa no day-to-day job de cada funcionário. "Esta é uma discussão que começa no topo da pirâmide, mas que tem de ir à base para confirmar a cultura da empresa", refere. “Se não trabalharmos a cultura interna, nada poderá ser implementado a fundo, a não ser que se faça uma empresa nova, com pessoas novas. A cultura é o que nos permite implementar novas formas de trabalho, perceber o que o cliente necessita, o que o mundo necessita! Se só trabalharmos a transformação digital de um ponto de vista tech driven, deixando de parte o business e people driven, o insucesso acontecerá”, conclui.
Da sua experiência de mais de 15 anos em processos de gestão da mudança, a docente do The Digital MBA refere também a importância de estar no terreno - "É importante ir ao terreno porque as pessoas estão habituadas a trabalhar de uma forma específica, que só aos poucos pode ser alterada. Estes projetos de mudança apresentam sempre resistência e desafios, por isso o alinhamento é crucial, para que depois seja possível disseminar novas formas de trabalho.”
Em relação ao método de implementação de medidas que visem a transformação digital, a atual Head of Commercial and Innovation da Galp dá a sua “receita”, referindo que toda a empresa tem de estar envolvida no processo - “É preciso haver um alinhamento claro, que parte da comissão executiva. [...] saber muito bem o que pretende, quais os objetivos a atingir. O projeto de transformação digital pode pretender, pura e simplesmente, atualizar os processos. Este alinhamento com objetivos claros, com KPIs, de mãos dadas com uma comunicação clara e constante sobre os objetivos atingidos/a atingir, é importantíssimo. Uma governance clara, transversal a toda a organização. E claro, a equipa é crucial! Uma equipa com paixão por estas áreas, que acredite que é através da colaboração e do trabalho com novas ferramentas digitais que se consegue chegar à transformação e líderes fortes, que questionem sempre se os processos podem ser ou não feitos de outra forma."