A mudança e a tecnologia já fazem parte do nosso dia a dia e vão ser fatores da equação do futuro. Exigem novas competências e vão estar na origem de novas profissões e da extinção de outras. Na era da quarta Revolução Industrial precisamos de competências 4.0 e de uma mudança de mentalidade.
O trabalho vai mudar muito num futuro próximo e a vários níveis, seja em novas profissões que vão surgir, na extinção de outras profissões e no recrutamento. Na era da quarta Revolução Industrial, a tecnologia é uma ameaça ou uma oportunidade?
Maria Adelaide Martins, especialista em Recursos Humanos e com larga experiência na gestão de pessoas, não tem uma visão catastrofista do futuro do trabalho, “de que os robôs nos vão tirar o trabalho”, mas alerta para a importância de anteciparmos os desafios do trabalho no mundo Vuca, o que implica uma mudança de mentalidade.
“À velocidade a que tudo está a mudar, temos de ser muito mais interventivos e mais participativos na condução da mudança (…). Se eu tenho algo mais que posso dar, com que posso contribuir, algum problema que eu posso evitar, alguma situação que eu possa agilizar, eu devo fazê-lo, faz parte da minha responsabilidade individual e, muitas vezes, não é essa a postura que vemos nas organizações”, acrescenta a diretora da Pós-Graduação em Gestão Pessoas da Porto Business School.
As organizações têm uma componente muito forte de intervenção para que a mudança possa acontecer, continua. “O futuro exige que sejamos otimistas radicais, que sejamos absolutamente resilientes, que tentemos perceber efetivamente o que é que tem que ser feito e aqui o papel das organizações é decisivo, o papel dos líderes, o papel dos CEOs e o papel dos recursos humanos. Os líderes, por exemplo, têm de perceber ao nível da própria configuração do negócio o que é que tem de mudar”.
A comunicação assume um papel essencial na gestão das organizações e nesta matéria os recursos humanos podem aproveitar os conceitos e a linguagem do Marketing para potenciar a sua ação. O que precisamos, afirma Maria Adelaide Martins, é de uma revolução semelhante àquela que aconteceu com o marketing e termos “linguagens e formas de estar mais transversais que ajudariam a “estarmos todos mais sintonizados nesta perspetiva, que é fundamental para conseguir ter a gestão adequada ao momento que estamos a atravessar e a antecipar o futuro”, alerta a atual responsável de Recursos Humanos da Ascendi.
5 milhões de empregos erradicados até 2020
A revolução tecnológica terá um enorme impacto no mercado de trabalho como o conhecemos atualmente, exigindo novas competências e uma aprendizagem constante e ao longo da vida. Estima-se que nos próximos cinco anos, a maioria dos postos de trabalho se tornem obsoletos o que muda totalmente o paradigma.
O relatório "The Future of Jobs" de 2016, do World Economic Forum aponta para a erradicação de cinco milhões de empregos até 2020, sendo os profissionais administrativos, de produção e de Direito os mais afetados, segundo o relatório. As profissões mais promissoras estão relacionadas com a tecnologia e o pensamento computacional – previsão de aumento na ordem dos 20% dos empregos relacionados com o desenvolvimento de software, analistas de sistemas informáticos e especialistas em pesquisa de mercado e marketing; a prestação de cuidados de saúde – estão entre as profissões que mais vão crescer até 2025; profissões relacionadas com o setor das vendas e do retalho que exigem soft skills como a inteligência social e emocional que os robôs ainda vão demorar a dominar; a educação e a formação cada vez mais essenciais para a aprendizagem ao longo da vida; a inovação e o empreendedorismo – profissões ligadas à gestão, contabilidade e auditoria terão os maiores crescimentos até 2025.
“A revolução 4.0 exige que as pessoas tenham competências 4.0”
O futuro do trabalho vai mudar também o papel dos profissionais de recursos humanos, que terão ao seu dispor a tecnologia para serem mais rápidos e ágeis no processamento de candidaturas, mas que exige um reposicionamento dos Recursos Humanos, o que implica uma maior ligação à gestão das organizações. “Atualmente, eu diria que é incontornável, porque nós temos de passar para uma revolução 4.0, as pessoas têm de ter competências 4.0, e as empresas não podem ser 1.0, 2.0 ou 3.0, também é exigível que sejam empresas e organizações 4.0. Quem é que vai ajudar a que isso possa acontecer? É aí que os recursos humanos têm um papel bastante decisivo na forma como vão levar as pessoas a fazer esse caminho para chegar lá”, argumenta a responsável da Pós-Graduação em Gestão de Pessoas.
A estratégia rumo ao futuro exige medidas que aumentem os índices e a performance das organizações a vários níveis: a empregabilidade, a formação e o desenvolvimento das pessoas, a comunicação, a diversidade, a inclusão e a igualdade de género. “É um ongoing constante. O negócio muda, as ferramentas de gestão de pessoas têm que mudar. O negócio muda, a visão e os valores têm que estar adaptados, portanto os recursos humanos são o garante permanente que há toda uma sintonia interna para que as coisas façam sentido e possa haver essa evolução”, sustenta.
A evolução tecnológica e o seu impacto exige que as estratégias das empresas no marketing, vendas, análise da concorrência, inovação ou na organização da estrutura, sejam revistas e que os colaboradores sejam capazes de se adaptarem à mudança, através da reciclagem de conhecimentos e aquisição de novas competências, principalmente tecnológicas. Fatores que ganham uma maior importância numa altura em que assistimos a crise de liderança global, em que as organizações enfrentam desafios exigentes, num mercado cada vez mais instável e em constante mudança, onde a tecnologia tem impacto em diferentes áreas das organizações.
Na opinião de Maria Adelaide Martins, sustentada pela experiência nas empresas por onde passou, entre as quais a coordenação e a direção de Recursos Humanos no Grupo Sonae durante quase uma década, o paradigma está a mudar a vários níveis, um dos quais o gap geracional nas empresas. Ou seja, a idade não é um problema e existe um maior equilíbrio entre diferentes gerações que partilham o saber numa organização, baseado no conceito de reverse mentoring.
“Ainda temos um longo caminho a percorrer, mas depende muito da forma como as pessoas se mantêm empregáveis, como se mantêm flexíveis, disponíveis, como se mantêm capacitadas para poderem continuar a ser válidas para as organizações, e as organizações terem a capacidade de construir estas combinações entre as diferentes gerações. Na minha organização tenho quatro gerações porque achamos que é importante reter talento, e não é só reter talento júnior é também reter talento muito sénior”, conclui a Diretora de Recursos Humanos da Ascendi.