Vamos focar-nos nesta última, pois está ao alcance de cada um de nós.
O impacto da pandemia COVID-19 na economia é algo que não conseguimos, ainda hoje, e já passadas várias semanas desde o início do estado de emergência, prever na sua globalidade. Algo sabemos, contudo, e com toda a certeza: será colossal e afetará todos – pobres, ricos, jovens, menos jovens, grandes, pequenos, norte, sul, desenvolvidos e emergentes…
Perante esta situação, os governos dos países e muitas outras organizações (regionais, nacionais, europeias, internacionais, de natureza económica, social ou política…) têm vindo a definir e a implantar medidas para enfrentar e colmatar a tal crise económica colossal. Em alguns casos, tratam temas ao nível do comportamento da economia como um todo, atalhando problemas relacionados com o nível global da produção do país, do emprego, dos preços. Testam-se aqui instrumentos de política fiscal, monetária, e eventualmente cambial. São elas as conhecidas políticas macroeconómicas. Em outros casos, ataca-se o problema pela perspetiva da oferta e da procura, com preocupações relativas à manutenção da capacidade de oferta de bens e serviços, por parte das empresas e de políticas para suster a respetiva procura. Surgem aqui medidas de apoio às empresas, através, entre outras, do suporte à tesouraria para pagar salários e a fornecedores, e do incentivo à manutenção das cadeias de abastecimento nos setores chave da economia. Estamos no domínio da microeconomia. A atuação a estes dois níveis, macro e microeconómico, será naturalmente fulcral. O sucesso de um está dependente do outro.
Hoje, venho defender que se atue numa ‘malha mais fina’, aquela que denomino de “nanoeconomia”. Pela primeira vez, deparamo-nos com o fecho da economia, provocado não por falta de rendimento ou de necessidade de bens e serviços, mas porque simplesmente não podemos vender, comprar ou prestar/adquirir serviços. E ao abrir a economia, vamos continuar a ter receios e, como sabemos, as coisas não vão voltar à (mesma) normalidade (a famosa recuperação em U não vai acontecer). A saúde virá sempre em primeiro lugar na atuação económica – há uma inversão de prioridades.
Neste contexto, proponho que a racionalidade económica dê lugar a uma racionalidade diferente, uma racionalidade social e ligada ao próximo. Crie-se e mantenha-se uma rede de desenvolvimento do pequeno negócio, do negócio da nossa proximidade. E este desenvolvimento pode ocorrer, tanto do lado da oferta, como do lado da procura. Do lado da oferta, o pequeno negócio deve reinventar-se, encontrar formas alternativas de se desenvolver, adaptadas ao momento. O comércio eletrónico é o mais óbvio, mas há muito mais – a entrega direta no domicílio, a transformação em serviços online.
Parece estranho em algumas áreas? Talvez não: no ensino é já óbvio, mas tal pode também aplicar-se a algumas consultas médicas, nutricionistas, psicólogos, e muitos outros, incluindo consultoria/serviços de bem-estar. Do lado da procura, também é fulcral suportar a economia da proximidade. Por exemplo, manter o serviço doméstico (com pequenas alterações), efetuar a aquisição antecipada de vouchers para bens e serviços futuros, a compra de bens de alimentação diretamente aos produtores locais ou no comércio do bairro, a aquisição de alimentação em takeaway, frequência de formação online (tão relevante num mundo em mudança como aquele em que nos encontramos).
Por fim, será fundamental que as políticas macro e micro sejam catalisadoras desta ação “nano”, por exemplo, simplificando as exigências ao pequeno negócio, dirigindo apoios, com flexibilidade e rapidez, aos negócios e setores que mais precisam. Do outro lado da moeda, esta atuação ao nível “nano” vai ser determinante para o sucesso das medidas macro e micro.
A nanoeconomia depende de cada um de nós. Façamos o que nos compete.
Artigo publicado originalmente no Dinheiro Vivo, a 19.05.2020